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Ei, você! Sim, você, adolescente.

Em um mundo hiperconectado, papéis de responsabilidade estão realmente definidos?

Ei, você! Sim, você, adolescente. Tudo bem aí? Sei que tem tanta coisa chamando sua atenção neste momento, então tentarei ser breve, tá?

E já aproveito para dizer que sei que isso não é uma falha sua, é uma estrutura de linguagem da época. Toda essa tecnologia faz com que nossa atenção seja dividida em várias camadas, abas, scrollings diversos, então pode ficar sossegado que eu entendo (principalmente porque uso isso tudo também, né?

Sei que uso numa velocidade muuuuuito diferente. Você está usando o celular como uma extensão do corpo, um novo membro. É quase parte constituinte de você. Tenho plena consciência disso, mas nós, os mais velhos, também podemos auxiliar com algumas coisinhas ainda. Um pouco mais lentamente, mas ainda assim, útil.

Portanto, vamos tentar nos comunicar de alguma forma, tá bom? Sei que muitas vezes não é fácil dizer, principalmente porque pode ser que você nem saiba que tem algo a dizer, às vezes faltam palavras, às vezes você usa o silêncio, às vezes você prefere agir para se expressar. Não se preocupe, são todas formas de linguagem.

E ser mais velho me dá um pouco mais de experiência. Portanto, mesmo você não sabendo muito bem o que dizer, faz com que eu tenha paciência para escutar você, mesmo sem o uso do verbal. Seu corpo diz muito, suas atitudes também. E também sei que tem muita coisa se mexendo aí nesse seu corpo. 

Sim, eu também já fui um adolescente. Pode não parecer, mas também já não tive palavras para expressar. Não é nada simples, ainda mais com tantas cobranças, não é?

Meus pais não me entendiam muito bem. Muitas vezes me senti deslocado não apenas no convívio familiar, mas também com os amigos. E era difícil falar sobre o assunto. Às vezes era raiva, às vezes tristeza, às vezes algo indefinível. A gente só quer sumir, explodir, não existir. No fundo, são tantas coisas que fica difícil escolher uma só.

Assim como no mundo moderno, não é? Tem tudo, e não tem nada que supra essa necessidade que se sente. Estou errado? Você pode ser tudo, seus pais até permitem que você possa escolher o que quiser, mas no meio de tanta coisa, como escolher apenas uma? 

Essa autorização de nossos cuidadores parece simples, mas vem com uma constituição de cobrança, correto? Tenho que fazer a escolha correta, definir meu futuro a partir dela. Tudo se define a partir daí. Você passa seu dedo rapidamente por todas as possibilidades do mundo e não se vê em nenhuma delas. Ou em todas elas!

E no TikTok tem tudo. E todos. E, ao mesmo tempo, não tem muita coisa. Se eu busco algo com mais conteúdo, encontro pouca coisa. Há texto demais, há linguagem demais. A mente perde o foco, direciona para outro lugar. “Olha só, mais um meme engraçado. Preciso passar esse sentimento para alguém. Na verdade, quero guardar essa sensação para sempre”.

E me frustro, porque passa rápido, assim como qualquer feed. Mas algo em minha mente diz que preciso continuar, porque hei de encontrar. Mesmo que me canse, que fique exausto de tanto olhar para a tela. Mais pequenos e rápidos afetos. Eles chegam e vão embora. Mas eu preciso de mais. Por isso uso a tela em excesso.

Ela me distrai dos meus próprios afetos, que ainda não consigo definir. Olho pro lado e meus pais também usam a tela do mesmo jeito que eu.  Talvez os adultos também não consigam definir os afetos. Se eles estão na mesma que eu, o que devo fazer?

Se eles exigem que eu seja responsável, que seja também um adulto, será que somos tão diferentes? Ou será que eu devo ser o adulto por aqui?

* Texto inspirado a partir de várias conversas com adolescentes no decorrer dos anos.1

** Imagens geradas por inteligência artificial.

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Sandro Cavallote é psicanalista, escritor, professor e comunicólogo. Especializado no acolhimento de adolescentes pela psicanálise. Pós-graduado em Semiótica e Análise do Discurso. Pós-graduando em Psicanálise e Análise do Cotidiano (PUC) e Coordenador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Psicanálise e Adolescência – Neppa/EPC.

  1. ↩︎

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